Não sou muito chegado em clichê, mas quando me falaram que muita gente não está gostando fiquei interessado e surpreendeu - gostei do filme.
Depois que assisti que fui descobrir que a diretora é a Greta Gerwig, a mesma que dirigiu o ótimo Lady Bird. Fica até contraditório mencionar isso aqui, mas o roteiro é escrito em parceria com o marido Noah Baumbach, que também tem muitos filmes bacanas, alguns comentados aqui no blog, por exemplo o Ruído Branco, no qual ela representa a esposa do personagem principal. Me explico, o que me ocorreu é que eles devem conviver em um ambiente bem criativo, aspecto que é discutido neste filme...
De fato vai deixar o público médio um pouco confuso, pois o texto subverte a estética, talvez essa pegadinha seja o melhor do filme.
Os tons de rosa e cenários recriando os brinquedos em escala real vão aos poucos contrastando com a desconstrução da personagem, que já é anunciada na cena de abertura tirada de 2001 Uma Odisséia no Espaço, mas vai se impondo aos poucos ao longo do filme.
Quem sair levando meninas vestindo rosa pro cinema (ou na pior das hipóteses for de rosa para o cinema) pode mesmo se decepcionar.
Boa qualidade técnica na fotografia e trilha sonora, já no gênero é bem misturado, como o próprio universo da personagem, tem de tudo: comédia, ação, romance, drama, cenas de musical...
Não sei se é muita viagem, mas vi muitas referências ao Matrix... seja na cena da escolha, nas cenas de luta e de perseguição. Até porque o roteiro é baseado na conexão entre o mundo das bonecas - a Barbielândia - e o mundo real.
E logicamente, nas camadas lá do fundo as histórias do Pinóquio e do Mágico de Oz, que o Spielberg incorporou melhor em Inteligência Artificial - cujo roteiro era do Kubrick - homenageado aqui na cena de abertura.
O filme começa com uma narração em terceira pessoa que logo some e volta depois para comentar exatamente que a Margot Robbie não serve para representar uma boneca deprimida porque está se achando feia... provavelmente bonecos e humanos são marionetes pra contar a história dessa narradora que se revela ao final.
O casal principal entrega uma atuação bem competente, de certa forma o coadjuvante Rian Gosling está até melhor que a M. Robbie. Ela consegue transmitir bem a evolução da personagem. Apesar do título o roteiro reserva um lugar muito peculiar para os Kens...
Para não deixar dúvidas, o roteiro repete as algumas vezes a mensagem de empoderamento feminino com espaço para os temas de diversidade, autoestima e a criatividade. O filme mostra que não há um único jeito de ser mulher e que todas devem ser livres para escolher seus caminhos. O filme também apresenta personagens diversos, a Barbie estranha e o interesse amoroso de Barbie, que é asiático e nerd, e a Criadora, que é uma mulher madura e bem-sucedida.
Curioso como a Mattel faz uma espécie de mea culpa mostrando uma Barbie que não se conforma com os padrões impostos pela sociedade e busca realizar seus sonhos sem perder sua essência.
Ao mesmo tempo que é uma inspiração para outras mulheres e meninas que se identificam com sua história, a boneca faz a autocrítica por impor um padrão estético irreal numa sociedade consumista e reforçar ao extremo o patriarcado machista.
O filme - assim como a boneca que se descobre - não é perfeito e tem alguns pontos negativos, como o excesso de clichês, algumas piadas sem graça e algumas cenas arrastadas. No entanto, esses defeitos não comprometem o resultado final.
Não merece oscar mas acho que vale a pena. Nota 8.
Ah e pode ser que algumas mães que levaram as filhas vestidas de rosa provavelmente não quiseram explicar a cena final...
Nos cinemas.
https://www.imdb.com/title/tt1517268/