domingo, 20 de julho de 2025

Apocalipse nos trópicos (2025)


Novo da Petra Costa, praticamente uma continuação de Democracia em Vertigem, talvez com menos acertos.

Propõe aprofundar as implicações políticas e sociais do avanço do movimento evangélico sobre a esfera pública brasileira, ensaio visual ambicioso sobre como a fé cristã foi mobilizada para alicerçar o poder político do inominável de tornozelo preso. 

Construído a partir de entrevistas inéditas, imagens de arquivo e passagens bíblicas interpretadas por figuras evangélicas influentes. O roteiro vai fazendo conexões entre o crescimento das igrejas neopentecostais e a ascensão da extrema-direita no Brasil. 

Acho que faltou ampliar um pouco a crítica colocando o catolicismo no balaio, e um panorama mais amplo da religiosidade polarizada no Brasil, a exemplo do que conseguiu o Eduardo Coutinho em Santo Forte

Não creio que vai estar no #Oscar2026 mas que vai sincronizar com a prisão dos golpistas vai.

Mesmo com certa superficialidade, é um manifesto essencial para condenar o pecado capital de misturar Estado e religião e demonstrar porque o Estado Laico é um dos pilares fundamentais da Democracia.

Acho que ganha força se for somado com o Podcast No Alvo, do ICL, que aborda a trajetória e a retórica do pastor Silas Malafaia. 


O filme expõe como líderes evangélicos, incluindo figuras como Malafaia, ajudaram a construir um discurso político que legitima práticas autoritárias sob o verniz da fé. O podcast revela como Malafaia domina os meios de comunicação, constrói sua autoridade com base na teologia da prosperidade e atua como elo entre os interesses religiosos e o poder institucional. 

Aproveite para rever O Processo, e conferir a série The Family da Netflix.

Nota 8, recomendadíssimo.


O Eternauta (2025~)


É bom ver uma produção latino americana destacando no mercado dominado por Hollywood, ainda mais agora que o cara pálida quer nos coitar mais do que já o fazem usualmente.

Adaptada de uma HQ famosa (que não tenho na coleção...) ficou acima da média das séries apocalípticas, sem depender (muito) de computação gráfica e com um protagonista anti-herói.

O ETERNAUTA VFX Breakdown by Miagui

Produção argentina, diversificação de investimento da Netflix que deu certo. Os seis episódios da primeira temporada foram gravados em Buenos Aires, aproveitando cenários urbanos reais.

Tudo começa com uma nevasca tóxica que cobre a capital portenha matando milhões em questão de horas. Aos poucos a trama vai revelando que se trata de uma invasão alienígena. Em meio ao caos, o protagonista Juan Salvo (Ricardo Darín) lidera um grupo de sobreviventes que tenta entender o que está acontecendo. 

[Depois dê uma conferida no meu post sobre a série Invasão, verdadeiro vacilo da Apple.]

Assim como em outras boas produções do gênero, o que está em questão aqui é a fragilidade da condição humana na hora do aperto. 

A obra original, criada por Héctor Germán Oesterheld e Francisco Solano Lopez na década de 1950, foi escrita em plena ditadura militar argentina como metáfora sobre autoritarismo e resistência. Oesterheld posteriormente revisou o quadrinho com críticas mais diretas à ditadura militar e às desigualdades sociais, o que teve consequências trágicas, pois ele foi preso e desaparecido pelo regime.

Essa adaptação abraça essa proposta e a potencializa: há crítica social explícita, reflexões sobre controle ideológico, militarização e o papel do indivíduo diante do poder. 

Enfim a invasão aqui é pretexto para temas  humanos, políticos e emocionais. 

A história envolve loop temporal,  mas a primeira temporada somente dá pistas disso por meio dos deja vus e lapsos de memória dos personagens e do Alien comandante, retratado por uma mão com inúmeros dedos, deixando o tema para a próxima temporada

Nesses tempos de tecnologia descontrolada e discursos extremistas, é uma boa reflexão sobre o que nos move, o que nos paralisa, e o que ainda nos mantém vivos.

Comic: El Eternauta, el cómic por el que perdió la vida su autor | Diario Sur

Nota 8.  Vale lógico conferir junto com Argentina 1985

Outro argentino sensacional sobre loop temporal é o Querida, vou comprar cigarros e já volto. 

O Eternauta (Série de TV 2025– ) - IMDb


Murderbot / Diários de um robô assassino (2025~)


Boa série de Sci-fi, com tom sarcástico muito bem humorado e usando bem os clichês. Mais um laser no alvo da Apple TV.

O título traduzido já provoca risadas. Melhor não.

Estrelada por Alexander Skarsgård, consegue pautar o tema atual da IA e fazer uma abordagem irreverente e profundamente humana das contradições que vêm com a liberdade, a empatia e o desejo de se desconectar do mundo.

Roteiro adaptado, o argumento envolve corporações que dominam a exploração espacial (para encontrar aliens, como sempre) e contratam robôs assassinos para proteger humanos em missões científicas. 

O personagem principal é um desses robôs, que hackeia o próprio sistema, eliminando os seus comandos de controle e fica fingindo que ainda está sob domínio dos clientes, enquanto assiste compulsivamente a novelas de sci-fi parecidas com Star Trek.

Ele  é forçado a interagir mais com os humanos e acaba fazendo conexões emocionais (!!!). Ao longo da temporada, acompanhamos o dilema entre o seu instinto assassino e uma crescente consciência ética, tudo narrado em primeira pessoa com comentários mordazes e um olhar mais que cínico sobre a humanidade.

Ou seja, acerta no essencial para qualquer obra de dramaturgia: o texto, que envolve nomes  vindos de produções como The Expanse e Mr. Robot. A seu modo é parecida com Resident Alien.

Ótima sacada dos mini-episódios das novelas dentro de cada episódio.

O ator principal consegue passar nuances sutis entre apatia, angústia existencial e sarcasmo puro. A performance evita caricaturas e torna o personagem tragicamente bem engraçado.

 O design de produção não é espetacular, é mais econômico em termos de efeitos, sets e cenários, mas não decepciona.

Enfim bom entretenimento, nesses tempos de sobrecarga tecnológica e busca de sentido em que nós, os robotizados, nos esforçamos para ser quase humanos...

Nota 8, recomendo. 

Apple TV.

Diários de um Robô-Assassino (Série de TV 2025– ) - IMDb

Penalty loop (2024)


Depois que vi Primer, continuo gostando de fimes de viagem no tempo e loop temporal, mas é bem difícil algum que supere, talvez o Coerência.

Esse aí é bem estranho eu não entendi, e pelo que eu li os críticos também não... e olha que a cópia que eu assisti estava dublada em russo.

Longa de 2024, dirigido por Shinji Araki, meio que tenta subverter o gênero "loop temporal".

A história acompanha Jun, um homem devastado pela morte brutal de sua namorada, Yui, assassinada por Mizoguchi.Consumido pela dor e pela sede de justiça, Jun elabora um plano meticuloso para matar o agressor. Após executar o crime e se livrar do corpo, ele acorda no dia seguinte apenas para descobrir que tudo voltou ao ponto de partida, o assassino está vivo, e o dia recomeça. Preso no loop, Jun é forçado a repetir o ato de vingança diariamente, mergulhando cada vez mais fundo em um ciclo de violência, obsessão e desespero. 

O problema é que o filme não se preocupa em explicar a origem do fenômeno temporal e foca nas implicações psicológicas e morais da repetição. À medida que Jun revive o mesmo dia, sua relação com Mizoguchi se transforma em um jogo estranho de reconhecimento e cumplicidade, onde os limites entre justiça e sadismo se tornam cada vez mais turvos.

No meio da trama aparece um contrato assinado que parece ser uma metáfora para o destino, em outro momento a namorada entra no carro dele fungindo de algo ou de alguém, mas nada disso é explicado e assim como o próprio personagem, o espectador dificimente conseguirá encontrar o sentido do filme.

Eu gosto bastante do cinema japonês, mesmo quando é mais non sense, mas esse exagerou na dose. Alguns que estão resenhados aqui no blog: Monster, Drive my car, Depois da vida, We are little zombies, A despedida, e o meu preferido A partida

Nota 5. Recomendo só para quem gosta de filme japonês estranho que você só encontra dublado em russo.

Penaruti rupu (2024) - IMDb


quinta-feira, 10 de julho de 2025

Invasion (2021~)


Geralmente as séries de ficção da Apple arrasam, aqui no blog tem várias resenhadas, como por exemplo Ruptura, Matéria Escura, Fundação, SiloConstellation e diferentona Calls

Essa saiu da curva e decepcionou, assisti a 1a temporada por curiosidade, fui até o 1o episódio da 2a temporada e perdi a paciência...

O argumento já não ajuda muito, de tão batido, mas a montagem parece um projetor de slides antigo mostrando uma  colagem arrastada de draminhas pessoais...

Tenta entrelaçar cinco histórias paralelas, mas a montagem falha em criar ritmo ou coesão. A abordagem se prende em convenções já desgastadas: famílias em fuga, soldados em conflito interno, cientistas isolados, mais do mesmo...

A invasão em si parece copiada da franquia Um lugar silencioso, que já tinha me dado uma preguiça interestelar.

Nota 4, não recomendo.

Invasão (Série de TV 2021–2025) - IMDb


sábado, 5 de julho de 2025

Diamante bruto (2024)


Diretora estreante Agathe Riedinger, estreou em #Cannes2024 e se tornou um dos mais comentados do evento. 

Bom argumento, uma reflexão sobre a saúde mental e os efeitos da cultura pop e das redes sociais sobre a identidade e autoestima da Geração Z, com uma crítica aos padrões estéticos excludentes e exposição constante nas redes sociais

A história acompanha  Liane, uma jovem francesa de 19 anos que mora numa casa modesta no sul da da França. Inquieta, ela é movida por desejos de beleza, fama e pertencimento e quer a todo custo se tornar uma celebridade. A busca pela fama leva a participar de testes para um reality show que promete transformação e sucesso instantâneo. 

O roteiro mergulha nos dilemas e contradições que envolvem a construção da autoestima em uma sociedade que exalta aparências.

Eu achei o ritmo excessivamente lento, com uma estética crua, meio documental, mostrando o cotidiano da jovem e  revelando suas vulnerabilidades e frustrações. O ideal inalcançável começa a corroer sua relação com o corpo, com a família e a própria identidade. O sonho de ser descoberta se transforma gradualmente em um pesadelo e a tensão emocional cresce à medida que ela é forçada a confrontar a superficialidade da sua vida.

O filme tem um tom de lamento que vem sendo comum em filmes franceses, sobre o desaparecimento de uma cultura erudita no mundo contemporâneo. 

Enfim, crítica ao mundo midiático, à cultura da celebridade e às estruturas sociais que perpetuam desigualdades de gênero e de classe.

O jeitão do filme me lembrou do vencedor do #oscar2021 Nomadland

Um ponto alto é a forma respeitosa e cuidadosa de mostrar o corpo feminino.

Nota 7. Recomendo.

Disponível no MUBI e PRIME.

Diamante Bruto (2024) - IMDb